A depressão não é apenas tristeza, nem preguiça ou falta de força de vontade. Trata-se de um adoecimento psíquico profundo, silencioso, que compromete a vitalidade, o desejo e a relação do sujeito consigo mesmo, com os outros e com o mundo.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2023), a depressão é a principal causa de incapacitação no mundo, afetando mais de 280 milhões de pessoas. No Brasil, é o transtorno de humor mais prevalente, sendo uma das principais causas de afastamento do trabalho e de suicídio.
Mas o que está por trás desse adoecer da alma? E como a psicanálise compreende esse sofrimento para além dos diagnósticos?
O que é depressão?
A depressão é um transtorno de humor caracterizado por:
Como a psicanálise compreende a depressão?
Para Sigmund Freud (1917), na obra Luto e Melancolia, a depressão (melancolia) ocorre quando há uma perda simbólica — do objeto amado, da autoestima ou de uma idealização. Ao invés de elaborar o luto, o sujeito introjeta o objeto perdido e volta a agressividade contra si mesmo.
“O paciente sabe a quem perdeu, mas não sabe o que perdeu nesse alguém” – Freud, 1917.
Já André Green, psicanalista francês da Société Psychanalytique de Paris (SPP), descreve a depressão como “o vazio do negativo” — um estado onde o afeto não circula mais, e o psiquismo se paralisa.
A Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA) ressalta que nos casos de depressão severa, frequentemente encontramos um eu esmagado por ideais superegóicos, por exigências internas impossíveis de satisfazer.
Exemplo clínico fictício
Carlos, 42 anos, buscou atendimento após meses sem energia para sair da cama. Apesar de estar em um emprego estável e ter filhos pequenos, dizia: “Nada mais me importa”. O olhar era apagado, a fala arrastada. Durante a análise, emergiram conflitos com o pai — um homem severo, ausente e altamente crítico. Ao longo das sessões, Carlos começou a reconhecer como havia internalizado essa voz crítica, exigindo de si perfeição constante. A depressão, então, começou a ser entendida como forma de silenciar o desejo para evitar mais fracassos.
Transtorno Bipolar: o outro lado do pêndulo
A depressão também pode surgir dentro de quadros de Transtorno Bipolar — caracterizado por oscilações entre episódios de depressão e de euforia (mania). Nesses casos, o sujeito alterna entre estados de vitalidade intensa e colapsos profundos, com risco aumentado de impulsividade, rupturas e sofrimento familiar.
Segundo o psiquiatra Antônio Geraldo da Silva (ABP, 2022), cerca de 60% das pessoas com transtorno bipolar são inicialmente diagnosticadas erroneamente apenas com depressão, o que atrasa o tratamento adequado.
A psicanálise compreende esses picos de euforia como tentativas de reparação imaginária de perdas profundas. A mania seria uma defesa contra a dor depressiva, uma negação da perda, como explica Otto Kernberg: “A euforia maníaca encobre o desespero que não pode ser sentido”.
Depressão é sinal de fraqueza?
Não. A depressão é sofrimento psíquico real e legítimo, e não deve ser romantizada nem moralizada. Winnicott, psicanalista britânico, dizia que muitos colapsos depressivos são, na verdade, sinais de que o eu não foi suficientemente sustentado no início da vida — e que o sujeito está, paradoxalmente, tentando sobreviver.
“A capacidade de estar só é um sinal de maturidade emocional” – Winnicott (1958).
Na depressão, o estar só é vivido como abandono e queda.
Como lidar com a depressão?
A escuta terapêutica é essencial. Algumas orientações:
🔹 Procure ajuda de um psicólogo ou psicanalista qualificado
🔹 Em muitos casos, avaliação e tratamento psiquiátrico são necessários
🔹 Não se culpe por não “dar conta”
🔹 Evite isolamento total — manter vínculos é importante
🔹 Exercícios leves, alimentação e sono regulado ajudam o corpo a sustentar o processo psíquico
🔹 Evite conselhos simplistas como "reaja", "tenha fé", "pense positivo"
A psicanálise como espaço de reconstrução
A psicanálise não oferece receitas, mas um espaço ético de escuta. Um lugar onde o sujeito possa encontrar palavras para o que ainda é dor muda, para o que ainda não pode ser nomeado.
Como escreveu Jacques Lacan, “o inconsciente é estruturado como uma linguagem”. E onde há linguagem, há possibilidade de transformação.
Conclusão
A depressão não é o fim. É um grito silencioso por reconstrução. Por sentido. Por cuidado.
Escutar esse grito é um ato de coragem. E buscar ajuda é um passo vital para sair do escuro.
📬 E você? Tem sentido que a vida perdeu o brilho?
Entre em contato no WhatsApp (51) 99466-5883. A escuta certa pode devolver cor ao que hoje parece cinza.
Psicólogo Luis Ismael dos Santos
ismael.santos@ufcspa.edu.br
13/07/2025 – 18h22
📚 Referências
Freud, S. (1917). Luto e Melancolia.
Winnicott, D. W. (1958). A capacidade de estar só.
Green, A. (1986). O trabalho do negativo.
Kernberg, O. (1992). Depression and personality organization.
DSM-5. American Psychiatric Association (2013).
Organização Mundial da Saúde (2023). Relatórios de saúde mental.
Sociedade Brasileira de Psicanálise e SPPA. Artigos e estudos clínicos.
PubMed, Scielo, PePSIC, Redalyc – Artigos sobre depressão e psicanálise (2020–2025).
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"A psicanálise oferece ao sujeito a chance de deixar de ser apenas um portador de sintomas
e tornar-se autor de sua história."
MANNONI, 1986